29.11.08

WILLIAM SAROYAN

(…) O mundo está cheio de pessoas que sabem histórias que darão filmes formidáveis, histórias que nunca foram escritas. O que parece é que os indivíduos que fazem os filmes nunca dão de cara com esta gente, ou, se dão, não estão para lhe dar ouvidos, por isso, é que a maioria dos filmes é uma autêntica porcaria, mesmo que tenham por estrelas Clark Gable, John Barrymore, Norma Shearer, ou outras do género. Os indivíduos que fazem filmes não se preocupam em fazê-los bons.
Só no bar do Izzy surgem, todas as noites, oitenta e sete argumentos para filmes magníficos. Todavia, jamais qualquer deles foi aproveitado para o cinema.
(…)

(excerto de O Génio, in O Índio do Packard: antologia, selecção e tradução de Alexandre Pinheiro Torres, Guimarães editores, 1961)

Efemérides deste ano I

Descobri há pouco tempo um livrinho com alguns contos de um Autor de quem nunca tinha ouvido falar: William Saroyan.
Após pesquisa, fiquei a saber que passaram este ano 100 anos sobre o seu nascimento.
Vale a pena ficar a conhecer.

27.11.08

[outros melros LIV]

RUI CAEIRO

ROLAS, MELROS


Descem do céu, de parte nenhuma, para debicarem
ora um ora outro, os restos de comida
no prato do gato

(de O Carnaval dos Animais, livraria Letra Livre, 2008 – honrosa oferta do Changuito, aquando da minha primeira visita à Poesia Incompleta)
RUI CAEIRO

Na minha terra travei conhecimento com as palavras. Primeiro, aquelas que os meus pais me ensinavam. Depois as outras, que estavam em volta. Depois as que eu trazia da rua, sempre mais apetecíveis e que brilhavam como uma moeda nova. Destas últimas, as mais interessantes eram sem dúvida as que tinham o cunho de proibidas.
A meu ver, todas elas, sem excepção, tinham direito à vida. Todas, mesmo as proibidas – principalmente as proibidas.
Todas eram, por igual, fruto da situação que as vira nascer. Todas eram imprescindíveis.

****

Na minha terra tomei gosto pelas palavras. As que ouvia, as que lia, as que dizia, as que não podia dizer. Tenho que reconhecer que algumas davam mesmo um prazer muito especial. Como um rebuçado que lentamente se dilui na boca, em contacto com a língua.

(de Pranto por Vila Viçosa, edição do Autor, 2007 – adquirido na livraria Poesia Incompleta, o local mais indicado para encontrar obras deste Autor)
Como não podia deixar de ser, lá fui à Poesia Incompleta, a nova livraria do Changuito.
"Livros novos e esgotados, portugueses e estrangeiros, edições deluxe ou mais baratinhas" e muita, muita diversidade. Além disso, um belo sofá onde nos podemos sentar e conversar com o proprietário.
Trouxe dois Caeiros e dois Gatos e o número zero da revista Índice.

Enfim, já vi que vai haver paragem obrigatória, de tempos a tempos, no n.º 11 da Rua Cecílio de Sousa.

Dos muitos que já se pronunciaram, destaco o Zé Mário Silva, que também incluiu umas fotos no seu post.

26.11.08

Entretanto...

A Rita, que aposto que atravessa sempre nas passadeiras mais por razões estéticas do que de segurança, criou a Rua da Abadia.
Muito interessante e muito bem escrito.

Entretanto...

O André Simões, mostra-nos as suas traduções de poetas árabes contemporâneos, no Pausa sobre as ruínas - الوقوف على الأطل


24.11.08

ITALO CALVINO

(excerto de) O Rei à escuta

(…) Somos reis, tudo o que desejamos é já nosso. Basta levantar um dedo e trazem-nos de comer, de beber, pastilhas elásticas, palitos, cigarros de todas as marcas, tudo numa bandeja de prata; quando nos dá o sono, o trono é cómodo, bem forrado, basta-nos semicerrar os olhos e abandonar-nos contra o espaldar mantendo na aparência a posição de sempre: o facto de estarmos acordados ou a dormir não altera nada, ninguém dá por isso. Quanto às necessidades corporais não é segredo para ninguém que o trono tem um buraco no assento, como todos os tronos decentes; duas vezes por dia vêm mudar o bacio; e até com maior frequência se cheirar mal.
Em resumo, tudo foi predisposto para evitarmos a menor deslocação. Não teríamos nada a ganhar movendo-nos, e tudo a perder. Se nos levantarmos, se nos afastarmos nem que seja um passo, se perdermos de vista o trono nem que seja por um instante, quem nos garante que ao voltarmos não encontramos outro qualquer sentado nele? Se calhar alguém parecido connosco, igualzinho. Vamos lá depois demonstrar que o rei somos nós e não ele! Um rei distingue-se pelo facto de se sentar no trono, usar a coroa e o ceptro. Ora quando estes atributos são nossos, o melhor é não nos separarmos deles nem por um instante.
(…)

(in Sob o Sol Jaguar, Tradução de José Colaço Barreiros, editorial Teorema, 1992)